sábado, 27 de setembro de 2014

Only Lovers Left Alive



Only Lovers Left Alive, Jim Jarmusch impecável e incrível, como sempre.
Tão lindo e delicado quanto Stranger than Paradise ou Flores Partidas.
Um filme de vampiros, nada a ver com o horrível “Crepúsculo” e o resto da saga; mas, resgatando o que tem de mais fascinante nas histórias de vampiros, o quanto pode ser curiosa a vida eterna ou extremamente triste e solitária. Uma história de amor entre Eve e Adam, dois vampiros, representados pela incrível Tilda Swinton e Tom Hiddleston, com participação especial de John Hurt.
Como todos os filmes de Jarmusch, a trilha é impecável. Adam é um roqueiro que coleciona instrumentos musicais.
Me lembrou “Fome de Viver” com Catherine Deneuve e David Bowie.

 “Somos todos fascinados por vampiros, porque eles vivem para sempre e nós temos medo da morte”, comenta Tilda,
Segundo Tom Hiddleston o casal representa a possibilidade do amor eterno. “É uma linda história sobre duas pessoas que se amam e aceitam um ao outro. Nós exploramos o amor no contexto da imortalidade”.

Além de conter preciosa trilha sonora, foi editado em ritmo poético, para extrair sensações ligadas à musicalidade dos personagens. O responsável por dar coesão a esta visão foi um brasileiro, o montador Affonso Gonçalves (“Indomável Sonhadora”), que Jarmusch elogiou em Cannes. “Ele trouxe um visual musical ao filme. Trabalhamos juntos todos os dias”, disse o cineasta. (Texto extraído do site UOL).









Só pra deixar com desejo de "quero mais" três links com músicas do filme!





segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Um vídeo



Volta e meia me pego revendo este vídeo.
Têm dias que me apego mais à direção do João Simi, sempre incrível; em outros, simplesmente, a locação, com seus móveis meio empoeirados, antigos e um pouco velhos.
Aquele janelão, o espelho imenso na parede.
A máquina de escrever! Eu “catava milho” igual a personagem.
E tem a interpretação, a voz e a beleza da Carolina Ferraz.
Mas, quer saber, é sempre o texto lindo, da própria Carolina, o que sempre me faz voltar!

 http://vimeo.com/45718018


domingo, 21 de setembro de 2014

Diana e Clarice, Corso e Lispector



Num domingo, como outro qualquer, depois da prática de yoga, me jogo no sofá pra ler a Zero, primeira leitura é o Caderno Donna, me delicio com os textos da Claudia Tajes, eis que me deparo com o lançamento de mais um livro de Diana Corso. Não conheço a Diana de perto, nunca nos falamos, diferente da Claudinha, nem fomos sequer apresentadas em algum evento.
Mas tenho uma simpatia pelos seus textos que acabaram se transformado em simpatia por ela.
Fala de psicanálise e adora Clarice. Eu li e reli todos os livros de Clarice e sou apaixonada por psicanálise. Talvez, por isso, a admiração.
Fadas no Divã, outro livro de Diana em parceria com seu marido Mario Corso, também psicanalista, é lindo!
Voltando ao lançamento do “Tomo conta do Mundo – Conficções de uma Psicanalista”, Diana também fala de Virginia Woolf, outra grande escritora, tão sensível como Clarice. Todas elas mulheres que revelaram muito do pensamento feminino.
O título do livro de Diana tem a ver com uma crônica escrita por Clarice, nos anos 70, “Eu tomo conta do Mundo”, extraída do livro “A Descoberta do Mundo”.
Eis a crônica:

“Sou uma pessoa muito ocupada: tomo conta do mundo. Todos os dias olho pelo terraço para o pedaço de praia com mar, e vejo às vezes que as espumas parecem mais brancas e que às vezes durante à noite as águas avançaram inquietas, vejo isso pela marca que as ondas deixaram na areia.
Olho as amendoeiras de minha rua. Presto atenção se o céu de noite, antes de eu dormir e tomar conta do mundo em forma de sonho,  se o céu de noite está estrelado e azul-marinho, porque em certas noites em vez de negro parece azul-marinho. O cosmos me dá muito trabalho, sobretudo porque vejo que Deus é o cosmos. Disso eu tomo conta com alguma relutância.
Observo o menino de uns dez anos, vestido de trapos e magérrimo. Terá futura tuberculose, se é que já não a tem.

Rita Elmor em "Que Mistérios Tem Clarice", com textos de Clarice Lispector e direção de Luiz Arthur Nunes.


No Jardim Botânico, então, eu fico exaurida, tenho que tomar conta com o olhar das mil plantas e árvores, e sobretudo das vitórias-régias.

Que se repare que não menciono nenhuma vez as minhas impressões emotivas: lucidamente apenas falo de algumas das milhares de coisas e pessoas de quem eu tomo conta. Também não se trata de um emprego, pois dinheiro não ganho por isso. Fico apenas sabendo como é o mundo.

Se tomar conta do mundo dá trabalho? Sim. E lembro-me de um rosto terrivelmente inexpressível de uma mulher que vi na rua. Tomo conta dos milhares de favelados pelas encostas acima. Observo em mim mesma as mudanças de estação: eu claramente mudo com elas.

Hão de me perguntar por que tomo conta do mundo: é que nasci assim, incumbida. E sou responsável por tudo o que existe, inclusive pelas guerras e pelos crimes de leso-corpo e lesa-alma. Sou inclusive responsável pelo Deus que está em constante cósmica evolução para melhor.

Tomo desde criança conta de uma fileira de formigas: elas andam em fila indiana carregando um pedacinho de folha, o que não impede que cada uma, encontrando uma fila de formigas que venha de direção oposta, pare para dizer alguma coisa às outras.

Li o livro célebre sobre as abelhas, e tomei desde então conta das abelhas, sobretudo da rainha-mãe. As abelhas voam e lidam com flores: isto eu constatei.

Mas as formigas têm uma cintura muito fininha. Nela, pequena como é, cabe um mundo que, se eu não tomar cuidado, me escapa: senso instintivo de organização, linguagem para além do supersônico aos nossos ouvidos, e provavelmente para sentimentos instintivos de amor-sentimento, já que falam. Tomei muita conta das formigas quando era pequena, e agora, que eu queria tanto poder revê-las, não encontro uma. Que não houve matança delas, eu sei porque se tivesse havido eu já teria sabido. Tomar conta do mundo exige também muita paciência: tenho que esperar pelo dia em que me apareça uma formiga. Paciência: observar as flores imperceptivelmente e lentamente se abrindo.
Só não encontrei ainda a quem prestar contas.”

domingo, 10 de agosto de 2014

Mistério



Alguém me falou que gosta de mistério.
Como foi uma madrugada de insônia, entre um filme e outro, pensava um pouco no que seria exatamente esta coisa “mistério”.

O dicionário online define da seguinte forma:
Significado de Mistério
s.m. Tudo que tem causa oculta, desconhecida ou é incompreensível, inexplicável; enigma.

Conjunto de doutrinas ou práticas que apenas os iniciados podiam conhecer: os mistérios de Elêusis.

Na religião cristã, dogma, verdade de fé inacessível à razão: o mistério da Trindade.

Segredo.

Nome dado às peças de teatro da Idade Média, inspiradas em assuntos religiosos e nas quais havia a intervenção de Deus, dos santos, dos anjos e do diabo.

(Do Lat. mysterium)
Sinônimos de Mistério
Sinônimo de mistério: abismo, enigma, escuridão e esfinge
Antônimos de Mistério

Se fosse me deter nos sinônimos e antônimos, ficaria com o segundo. Mas, claro que não é disto que estamos falando – escuridão ou abismo. E sim de coração pulsante, um certo rubor,  arrepio, pele, desejo, fantasias, enfim, sensações e suas particularidades.
Bem, sou curiosa por natureza, sempre fui.
Dá pra ter todas as sensações acima com prazo de validade para o mistério?!
Me  parece que os homens se sentem mais atraídos pelo mistério, principalmente, os “mistérios” que rondam uma mulher.
Me veio na mente algumas cadeiras de psicologia e alguns trechos de Freud falando um pouco sobre o tal mistério em relação à mulher. Encontrei o texto abaixo:

“Do homem, uma mulher só desejaria duas coisas: que a colocasse em um pedestal de modo a confirmar seu valor como objeto privilegiado do desejo dele; e que lhe propiciasse a única e verdadeira experiência de plenitude a que a mulher teria direito: não o êxtase do sexo, mas o da maternidade. A feminilidade seria uma espécie de preço pago pela mulher ao homem, visando a obtenção do falo-filho. “A mulher freudiana é aquela que diz ‘obrigada’ ao homem”, escreveu Colette Soler.
O homem freudiano seria o narciso ferido, sempre inseguro de seu valor; eterno amante dedicado a conquistar o amor da virgem inexperiente a quem caberia, depois do casamento, reconhecer a virilidade dele. A mulher representava o objeto misterioso que, embora dependente material e juridicamente do parceiro, jamais lhe revelaria o segredo de seu desejo e de seu gozo. O homem freudiano ocupa a posição do amante e a mulher, a do objeto idolatrado. Mas para que a estratégia funcione, é essencial que a moça conserve uma aura de mistério e de estudada indiferença. Nisso consiste a mascarada da feminilidade, cuja função é ocultar a verdade do desejo e da castração femininos.
Onde se encontram, hoje, as “verdadeiras” mulheres freudianas? Teremos nós, gerações pós-feministas, esquecido os artifícios e artimanhas que nos faziam tão atraentes quanto inacessíveis para a fantasia masculina? Hoje, não nos parece que os homens é que andam arredios, ao passo que as mulheres do século XXI se comportam como guerreiras que assediam a gélida fortaleza masculina? “O que faço para sustentar meu desejo por esta que se entregou a mim desde o primeiro momento?” perguntam os rapazes de hoje que, por angústia e vingança, transformam suas amadas em grandes mães assexuadas.
A linha divisória entre homens e mulheres, pelo visto, perdeu sua antiga fixidez, trazendo mobilidade e liberdade para ambas as partes. Se o falo não é um pênis e sim um significante, seu manejo está franqueado a homens e mulheres. Só que, ao insistir em sustentar a equação pênis=falo, os homens acabam por se colocar em uma posição muito mais frágil do que as mulheres. Estas recém descobriram, por conta da própria psicanálise, que o órgão masculino só possui o valor fálico que elas lhe conferirem.
Freud estaria enganado em suas observações a respeito das diferenças entre os sexos, das quais faço aqui uma proposital caricatura? Não creio. O que ele não poderia prever é que as transformações da cultura, para as quais a psicanálise desempenhou no século XX um papel central, fariam por deslocar as mulheres de seus lugares tradicionais até exigir a construção de outra feminilidade ou, ainda mais: de outra relação dialética entre homens e mulheres.
Não é impossível então, que na medida em que as mulheres se livraram de algumas restrições sexuais e existenciais impostas pela moral vitoriana, a  linha demarcatória entre a masculinidade e a feminilidade tenha se deslocado – forçando os homens, por enquanto, a jogar na defensiva. Freud já havia percebido a existência de um hiato na complementaridade imaginária entre homens e mulheres, a ponto de perguntar a sua amiga Marie Bonaparte: mas afinal, o que quer uma mulher? Pergunta que repercutiu em todas as gerações de psicanalistas, sobre tudo homens. Ora: é claro que ninguém pode saber o que deseja uma mulher. O desejo é, por definição, inconsciente. Um homem também desconhece seu próprio desejo.
Quanto ao suposto mistério do querer feminino, este que se manifesta através de fantasias triviais e de pequenas reivindicações dirigidas ao outro – bem, nesse caso qualquer mulher pós-freudiana poderia responder: eu quero o mesmo que você.
E nesse caso, a diferença sexual continua um mistério – para os homens e para as mulheres.
(Maria Rita Kehl)